sexta-feira, 27 de dezembro de 2013
A teia de aranha
foto de Justine do blogue "Quarteto da Alexandria"
A aranha cria uma teia ou uma rosa
numa teia
não para outra aranha companheira
obviamente para uma mosca
mas pelo prazer de a tecer
ela ateia a delícia do seu prazer
e quase se esquece da mosca
ou de todo se esquece
pelo prazer de a tecer
como uma estrela uma rosa ou uma renda de fios
tão finos
que na sua evidência de insignificância aérea
de todo se esquece da sua mosca intencional
que de qualquer modo acaba por ser caçada e devorada
num tapete de linhas transparente
era para ela sim caçar a mosca
mas como um pretexto
para tecer a teia como um texto
que ela tecia e girava
na autónoma delícia do prazer.
poema de António Ramos Rosa, poeta algarvio
sábado, 14 de dezembro de 2013
Um pedaço de mar
Um pedaço de mar, só um pedaço, melhor ainda, um pedacinho
desse grande oceano, que dá pelo nome de atlântico, entra no porto de abrigo
aqui, à minha frente e suavemente faz baloiçar os pequenos barcos que se
encontram em descanso. Foi assim, hoje, aqui no porto da baleeira, perto do Jardim d'abrolhos, em que o
vento soprava forte causando alguma ondulação fora da doca.
texto e fotos de Benó
quinta-feira, 12 de dezembro de 2013
INFANCIA
Esqueço o jantar.
Roupa para engomar.Que importa brinquedos no chão
Quartos por arrumar
Almofadas a servir de colchão.
Ignoro os gritos dos índios.
Os tiros dos "cowboys".
Correrias, atropelos.
Estou dentro, entro na onda.
São muitos os apelos.
Jogo ao ringue, salto à corda, faço rodas.
Sou novamente criança
Companheira de aventuras, das escondidas.
Rejuvenesço.
Revivo com a petizada
Os sonhos, as esperanças,
Risos, lágrimas, abraços, despedidas.
domingo, 8 de dezembro de 2013
Sou quem sou
Entre piteiras e catos, neste jardim d’abrolhos, sou quem
sou.
Mulher, mãe, avó.
O aconchego, o carinho, o amor. Pele morena enrugada, cabeça
nevada. Mãos largas nos carinhos oferecidos, braços pequenos para tantos
abraços recebidos.Sou o oceano revolto quando chega o vento do desespero.
Sou a frescura do oásis em dias de revolução.
Sou a inocência infantil no jardim das crianças.
Intransigente no querer, no estar. Exigente no saber.
Ficcionária, onírica, ave solta. Livre no escrever.
Procuro a verdade da vida, no ler. As letras são mundos desconhecidos.
Viagens a descobrir.
Seguro a vida que vai aos poucos caminhando pela estrada que
construí. Seguro-a, firmemente, enquanto rodeada de outras vidas que, juntas, formam
um todo: a minha própria vida, a minha existência. Não me pertenço.
Não estou só.
Sou quem sou.
Mulher, mãe, avó.
texto e foto de Benó
quarta-feira, 4 de dezembro de 2013
Outono
Cerram-se as cortinas nas janelas escurecidas pela tarde que
termina.
Os candeeiros, na rua, abrem os olhos até aí adormecidos,
numa languidez soturna, vagarosa, como se tivessem medo da escuridão que se
aproxima. O arvoredo calou as conversas com o vento e até a rosa vermelha parou
de alisar as pétalas.
Os filhos aninham-se no colo dos pais enquanto as mães, com
a boca cheia de beijos, cozinham a sopa do jantar.
Os gatos de cor parda esperam a hora da saída para os
telhados onde as chaminés libertam o fumo retido nas brasas das lareiras.É outono.
texto e fotos de Benó
quinta-feira, 28 de novembro de 2013
Duas pedras
O vento, a chuva, a seca, as intempéries resultando numa erosão cuidada e meticulosa, talvez até, artística deram a estas pedras um perfil quase humano. Elas são espectadoras atentas ao que se passa no areal. Sabem quantos bagos de areia são necessários para formar uma duna, compreendem as conversas tidas entre as algas e os limos, ouvem as discussões dos caranguejos com as estrelas-do-mar, conhecem os ventos que sopram dos vizinhos desertos africanos ou aqueles outros, gelados, vindos do norte, onde moram as renas e as focas, também são maltratadas pelas fortes lufadas que chegam do sul, normalmente, carregadas de nuvens pesadas e negras. Entre elas, não perdem uma deliciosa cavaqueira sobre o Bóreas e o Nótus.
O sol,
indiferente à beleza da onda que enrola e desenrola em brincadeira com as
conchas e os mexilhões, segue a sua viagem diária perdendo-se para lá das águas
profundas do oceano.
As pedras continuarão presas ao mesmo lugar, de onde podem
dizer adeus aos marinheiros que passam ao largo rumando a aventuras que elas nunca
poderão viver; sempre no mesmo lugar, de onde assistem a grandes tempestades
mas também a belas e calmas bonanças; de onde podem extasiar-se ante os coloridos
ocasos nas profundezas do infinito oceano; sempre no mesmo lugar, até que o
gastar dos tempos as faça tombar, sem dó nem piedade, no fundo da falésia, nas
águas que agora lhes beijam os pés, elas ali estão,
num local, aqui, perto do Jardim.
foto e texto de Benó
domingo, 24 de novembro de 2013
Por trás das gelosias
Por detrás das gelosias há segredos não contados. Vidas secretas, discretas.
Por detrás das gelosias espreita-se a rua, as vizinhas que
param e conversam numa perda de tempo sem fim, os beijos atrevidos dos
namorados, o cão que ladra à bicicleta que passa e o gato que afia as unhas no
tronco da árvore.
Por detrás das gelosias suspira-se e aguarda-se a chegada do
carteiro. Sonha-se com a carta há tanto desejada, há tantos dias para chegar.
Vê-se tudo que se passa lá fora, indaga-se interiormente,
cogita-se mas não se abre as cortinas por detrás das gelosias.
texto de Benó
quarta-feira, 20 de novembro de 2013
Rua molhada
foto e texto de Benó
A rosa vermelha espreita a rua molhada onde as luzes dos
candeeiros já se refletem no acabar de um dia chuvoso deste outono ameno, aqui
no Jardim d'abrolhos.
quinta-feira, 14 de novembro de 2013
Há moiro na costa
foto e texto de Benó
Numa alegria constante, espalhava risos e gargalhadas por entre
familiares e por todos os que com ela conviviam. Era o braço direito de sua mãe,
uma preciosa ajuda para tratar e cuidar dos mais novos e dos muito mais velhos
que ainda faziam parte dos viventes naquela casa sempre em constante movimento.
De repente, o seu estar modificou-se.
Andava numa distração permanente. A avó queixava-se dos seus
silêncios e da falta de companhia para jogar ao dominó, o seu jogo preferido ou
para conversar; a mãe, das suas demoras quando a mandava à rua fazer qualquer recado
e os mais pequenos choravam pela falta das brincadeiras habituais.
Dir-se-ia que a casa estava a tornar-se pequena e a
adolescente necessitava de sair mais vezes para conversar com as amigas, de
espaço, de liberdade ou então de estar só, isolada, longe de tudo e todos, a
ouvir o bater descompassado do seu coração.
Com alguma frequência, podíamos vê-la debaixo das árvores do
jardim, deitada na relva, fitando o céu com aqueles seus olhos grandes, absorta
em pensamentos que eram só seus.
Até o pai começou a notar que a sua menina estava diferente e,
como pessoa habituada às mudanças dos humores juvenis e femininos, comentou com
a mãe, igualmente conhecedora dessas coisas e dos jovens corações apaixonados:
-“Há moiro na costa"
sábado, 9 de novembro de 2013
Perdão
Esquece.
Vem até mim
Escuta o rugir das marés
nos silêncios mudos
dos nossos sentires apaixonados.
Abraça-me.
Esqueci.
As palavras que não foram ditas
Não ouvi.
Não escutei as palavras que não disseste.
As minhas mãos estão vazias.
Nada guardei.
Nos olhos, as lágrimas que não chorei.
Esquece.
Esqueci.foto e texto de Benó
quarta-feira, 6 de novembro de 2013
Gaivota
Manhã cedo, com o sol ainda adormecido e a bruma matinal a
pairar sobre o casario numa envolvência fria e húmida, a senhora gaivota, pousada no muro que circunda todo o espaço da fortaleza da Sagres, é a
primeira observadora atenta às ondas na praia do surf situada lá em baixo, aninhada entre as altas falésias que lhe conferem proteção ao mesmo tempo que oferecem a beleza natural dos areais da costa vicentina.
foto e texto de Benó
quinta-feira, 31 de outubro de 2013
Ocaso
Aquela bola de fogo que nos aquece e nos prende nos seus
fogosos braços, que é sinónimo de vida e fecundidade, esconde-se nas águas do oceano
num mergulho suave, sem splash, para ir dar luz e vida a outros seres outras
gentes, desde que o mundo é mundo num ritual diário, desde sempre. A bola de
fogo incendeia céu e mar, pinta labaredas nas cores mais quentes da paleta
divina onde, há poucos momentos, só o azul era cor e, dá lugar a um espetáculo
inigualável presenciado por multidões de diversas origens que ficam estarrecidas
ante a beleza daquele momento em que o dia já não o é, nem a noite ainda é.
Para culminar, as aves calam-se, o vento abranda o seu queixume
e as palmas irrompem num vibrante aplauso à despedida do sol, ali, no fim do
mundo. Erguem-se taças borbulhando de líquido que se bebe entre risos e
abraços.
E os espectadores mais atentos e místicos ouvirão,
certamente, o burburinho provocado pelos deuses que, naquela hora, se reúnem
nas salas cavernosas das profundezas do oceano.
Diariamente, no Cabo de S.Vicente.
segunda-feira, 28 de outubro de 2013
Primaveras
Podes dizer-me que já não há mais primaveras, que as flores murcham
sem desabrocharem, que os rios gelam antes de chegar ao mar ou que as árvores morrem
sem oferecerem abrigo às aves nos seus ninhos.
Ouvir-te-ei carinhosamente enquanto me olhas como só tu o
sabes fazer quando mentes. Como podes dizer que já não há mais primaveras?
Sim, eu sei, a neve criou morada na minha cabeça mas o meu
coração bate ao sabor das marés ora manso, calmo e sereno, ora agitado, revolto
como a tempestade.
Sinto a primavera em cada gorjeio dos pássaros que me
habitam. Os meus dedos entrelaçam os raios de sol num novelo de imensos matizes;
da terra quente germinam as sementes guardadas no seu ventre; os dias
sucedem-se às noites estreladas, enluaradas ou negras, densas, misteriosas.
Tu sabes que há flores
eclodindo da neve e, aqui, no Jardim, será sempre primavera.
domingo, 27 de outubro de 2013
Amigos
Esta semana no blogue PPP houve "Jornal de Parede". Cada colaborador(a) deveria enviar uma noticia, um pensamento, uma imagem em foto ou em texto ou uma coisa completando a outra, que achasse relevante para informar os outros.
O Paxá e o King, dois amigos, dois companheiros, fizeram parte do Jardim d'abrolhos durante muitos anos. Pelas suas brincadeiras, pelo carinho recíproco, pelas lembranças que ainda perduram, quis pô-los em notícia e, assim, homenageá-los.
sábado, 26 de outubro de 2013
O risco riscado
O risco riscado no alto,
lá longe, tão longe que nem se vê o riscador, parece uma linha fininha de seda ou algodão
esticada pela habilidosa mão de costureira ou bordadeira
usando na agulha a bordar ou a costurar um vestido,
um bordado bem desenhado e esticado no seu bastidor.
O risco riscado lá no alto é um pássaro que transporta
no seu ventre alargado
gentes de um para outro lado.
foto e texto de Benó
sexta-feira, 25 de outubro de 2013
Temperos
Na parede branca sem qualquer ornamento, ali, mesmo junto à porta da cozinha, tenho os coentros, os piripiris. Aproveitei esta desusada sapateira que se encontrava atirada para os monos da arrecadação e organizei assim, todos em um. Ali, mesmo à mão de semear, tenho os temperos e dei colorido a um espaço frio.
quinta-feira, 24 de outubro de 2013
A palmeira agonizante
Pés enterrados, seguros, firmes. Cabeça ereta de
longos cabelos açoitados pelas ventanias vindas do gélido norte ou do quente deserto
africano. Tudo ela suportou. O seu grosso tronco, nas cavidades próprias da vida
longa que já suporta, foi, e ainda é, pouso de sementes trazidas pelos
elementos alados que ali procuram descanso e, quiçá, alimento. Essas sementes,
graças às boas condições térmicas encontradas, germinam rapidamente e uma flora,
em diversos tons de verde, ainda adorna o corpo da árvore que já conta com um
quarto de século.
Chegou ao fim a sua vida ferida pelo maldito escaravelho trazido pelos ventos
quentes da vizinha África. Aos poucos tem perdido o seu vigor, o seu porte
altivo esmoreceu e agora agoniza numa morte lenta. Pobre palmeira, símbolo de
resistência, sinal de frescura em oásis perdidos no meio do areal, companheira
de sombra em momentos de leitura, dentro em pouco nada mais será do que um cepo
que perdurará em sua lembrança.
O jardim d’abrolhos retoma a sua actividade
com esta pequena homenagem a uma das árvores que tem acompanhado as
brincadeiras dos meus netos. Junto da araucária, a lhe prestarem guarda,
estiveram duas palmeiras. Agora, só uma balouça as suas longas folhas nas
brisas da tarde.
terça-feira, 20 de agosto de 2013
Calor
Gretas, rugas, socalcos a desenharem figuras geometricamente
diabólicas na pele da terra abrasada pelas labaredas dardejantes do sol.
A crosta terrestre retrai-se, expande-se, cresta, morre de
sede e anseia pelas frescas águas do outono. Secam os ribeiros, definham as
plantas e, dos trilhos percorridos pelos caminhantes curiosos em mergulhar na
bela flora da costa vicentina, solta-se e anda no ar uma poeira vermelha
queimada pelo calor que nos suja e se cola à pele.
É o verão que nos oferece a beleza tórrida destes dias sem
vento tão habitual aqui, no cabo.
quinta-feira, 11 de julho de 2013
Silêncio
Porquê o silêncio me perturba?
As asas das borboletas que voejam pelo jardim soam como velas de moinhos gemendo nos seus rodízios em dias de ventania.
Neste silêncio que me cerca, o rastejar dos vermes da terra ecoa como as marés espraiando-se pela areia e a folha caindo da árvore chega ao meu sentir como uma onda batendo na falésia em dia de maresia.
O silêncio envolve-me, perturba-me, causa-me medo. Não raciocino, não penso, estou inerte.
Hoje, sou prisioneira do silêncio.
foto e texto de Benó
terça-feira, 18 de junho de 2013
Brincadeiras no escuro
foto e texto de Benó
Era apenas mais uma noite invernosa. A chuva lá fora caía
impiedosamente. O vento soprava empurrando à sua frente as folhas jovens que
fragilmente se agarravam aos braços da mãe árvore. Ninguém passava na rua e as
janelas eram olhos entreabertos deixando passar tiras de luz das casas ainda
acordadas.
Como habitualmente em noites de invernia, a luz retirou-se
não se sabe para onde, talvez com frio e o apagão foi geral.
A lareira chispava e iluminava debilmente a sala onde nos
encontrávamos. Com o isqueiro que está sempre à mão, acendemos a vela e brindámos
à claridade que pelas paredes desenhava figuras abstratas executantes duma dança de luz e sombra.
Foi apenas mais um apagão numa noite invernosa em que a escuridão nos convidou à brincadeira habitual de fazer bonecos chineses com as mãos.
sábado, 25 de maio de 2013
Nevoeiro
foto e texto de Benó
O nevoeiro espalhava-se, víamo-lo a estender preguiçosamente
os seus braços para rapidamente engolir as charnecas, devorar estevas,
rosmaninhos, rosas albardeiras, tojos, jóinas. Fauna e flora tudo desaparecia por
dentro do abraço frio e húmido daquele visitante pesado e indesejado. As
palmeiras do jardim da avenida sentiam-se apertadas naquela densidade pegajosa
e pelas suas longas folhas inertes escorriam lágrimas penosas que só o vento as
faria secar.
O palmeiral ansiava pela chegada do ventania fria e forte à
qual já se habituara e que, rapidamente, poderia dissipar aquelas gotículas de
água que tudo molhava e tornava cegos os olhos que não viam “um palmo à frente
do nariz”.
domingo, 19 de maio de 2013
Flores da rua
Cada vez há mais flores nas bermas dos caminhos, na beira
das estradas por onde passam camiões, automóveis com cavalheiros que param para
as colher.
Poluição social.Flores desenraizadas, sem húmus para viver. Entre as pedras procuram a força necessária para o seu desabrochar. Terão uma existência curta e serão pisadas e serão cuspidas, maltratadas, arrancadas ao seu meio ambiente.
Serão flores murchas sem jardim.
foto e texto de Benó
segunda-feira, 13 de maio de 2013
Escadas da vida
Escadas que se sobem.
Escadas que se descem.Degrau a degrau, sem canseira nem cansaço, vais subindo a escada da vida, passo a passo.
Nalguns patamares na subida, paras e às vezes desces.
Prossegues, a subir ou a corrigir o teu caminhar para mais rápido ou mais devagar.
Quando a corda do relógio da vida se partir, descansarás então.
Os teus sonhos serão asas e voarás.
Haverá mais uma estrela no céu.
sexta-feira, 10 de maio de 2013
Livros
imagem da net
Livros amigos que me contam baixinho todos os seus segredos.
Com eles derrubo gigantes, enfrento tempestades, choro e rio. Medito e sonho,
avanço no futuro e volto ao passado, tudo isto estes amigos me oferecem sem
pedir nada em troca. Não se queixam se deles me esqueço abertos ou fechados sobre
qualquer mesa ou cadeira, não reclamam se, momentaneamente, os troco por dois
dedos de conversa com as amigas.
Por vezes, fico pelo meio do assunto descrito, não consigo
ouvir até ao fim as histórias que me estão a contar. Interrompo um, começo
outro ou tenho dois e três no colo dedicando-lhes a mesma atenção, ouvindo-os
alternadamente e com o mesmo interesse. Não são ciumentos nem um quer ser mais
que o outro.
Os livros preenchem os meus momentos de solidão. Com eles
não há espaços vazios dentro de mim. As suas letras são palavras que compõem o
meu viver, o meu estar neste Jardim d'abrolhos
segunda-feira, 8 de abril de 2013
POINSÉTIAS
Estas poinsétias foram oferecidas pelo Natal. Não estavam sobre este móvel mas no chão num recanto bem iluminado e acompanhadas por algumas orquídeas. O Natal já passou, a Páscoa igualmente, mas elas continuam oferecendo a sua beleza colorida e por isso, achei que tinham direito a uma foto para o blogue. Quero transferi-las para o jardim, mas não sei bem qual a melhor altura para o fazer. Se alguma das minhas visitas me souber esclarecer, agradeço e, certamente, as poinsétias também.
sexta-feira, 5 de abril de 2013
AMARILIS
Os amarílis entre a sombra e a luminosidade branca da parede
vão resistindo aos ataques dos caracóis que todas as manhãs caço para os
colocar onde devem estar: no campo a pastar e não no jardim a comer flores.
Da terra brotaram. Do sol se alimentaram. Beberam a água da
chuva e com a sua beleza vermelhavibrante me encantam todos os anos numa grande saudação à primavera.
foto e texto de Benó
quarta-feira, 27 de março de 2013
Por detrás das gelosias
Por detrás das gelosias há segredos não contados. Vidas
secretas, discretas.
Por detrás das gelosias espreita-se a rua, as vizinhas que
param e conversam numa perda de tempo sem fim, os beijos atrevidos dos
namorados, o cão que ladra à bicicleta que passa e o gato que afia as unhas no
tronco da árvore.
Por detrás das gelosias suspira-se e aguarda-se a chegada do
carteiro. Sonha-se com a carta há tanto desejada, há tantos dias para chegar.Suspira-se de saudade por alguém que partiu prometendo voltar. Há mundos de esperanças que olham para a rua.
Vê-se tudo que se passa lá fora, indaga-se interiormente,
cogita-se mas não se abre as cortinas por detrás das gelosias. Os sonhos continuam dentro da casa com as cortinas corridas.
foto e texto de Benó.
quarta-feira, 20 de março de 2013
As folhas
As folhas rodopiam numa dança coletiva em que vão todas ao centro como num baile mandado e numa corrida rápida fogem para se voltarem a juntar e rodopiar em ritmo ora suave ora acelerado, onde todos os elementos se entregam e se abraçam.
Assim, as mãos se procuram e se encontram, se escondem e entrelaçam, desunem-se e se afastam, se atraem e apertam para, enfim, desfalecerem inânimes junto aos corpos húmidos e cansados de tanto corridinho.
foto e texto de Benó
sábado, 23 de fevereiro de 2013
Escadas
Escadas que se sobem.
Escadas que se descem.
Degrau a degrau, sem canseira nem cansaço,
passo a passo vais subindo a escada da vida.
Já paraste nalguns patamares na subida.
Meditaste. Sonhaste.
Olhaste em teu redor e às vezes desceste.
Prosseguiste, subindo, parando e olhando, corrigindo o caminhar ora mais rápido ora mais devagar.
Nesta longa subida que é a vida, no grande e último patamar, quando o relógio te impedir de prosseguir, poderás, então, descansar.
Os teus sonhos serão asas e voarás.
Haverá mais uma estrela no céu.
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013
Nada encontrei
Num dia longo, sem fim, caminhei praia fora, enterrei os pés na areia, refresquei-os na água fria.
Procurei, chamei, mas só as ondas me respondiam no sossego daquela praia.
Andei. Fugia de mim para te encontrar.
O vento varreu as lembranças, os sonhos, as esperanças.
No deserto areal por onde passei nada deixei.
Nada encontrei.
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013
O pote de barro
À beira da estrada, o pote de barro ouve a marulhada do Tonel, vê o sol mergulhar no azul do mar.
Olha as nuvens em corrida num corcel.
Vê os aviões, os carros, as bicicletas.
Passam por ele gaivotas, pardais e borboletas.
Ouve conversas de pescadores e caçadores.
Tudo isto sem sair do seu lugar,
O gordo pote de barro.
quarta-feira, 30 de janeiro de 2013
Pequeno almoço
Os pardais saltitam, as rolas esvoaçam em alegre união convivem e brincam na procura de sementes entre os tufos de relva. Os pretos melros enfiam o bico cor de ouro, no relvado húmido e fofo enchendo-o com as saborosas minhocas. Não falta um bom pequeno almoço para os habituais utentes do jardim d'abrolhos. Há, porém, os visitantes ocasionais: pombos, garças e também gaivotas mas esses procuram alimento mais acima, no terreno lavrado.
quinta-feira, 17 de janeiro de 2013
Sonhos em flor
Não deixes a erva crescer em redor dos teus sonhos em flor. Arranca-a
pela raiz, monda e cava, fornece-lhe substrato e verás o desabrochar dessas
flores que rapidamente se transformarão em doces frutos.
sábado, 12 de janeiro de 2013
Raizes
Raízes, nuas, descarnadas, torcidas e retorcidas. Agarram-se
à terra e dela tiram o suco necessário para a sobrevivência do seu corpo.
Não lhes importa o sol escaldante ou a chuva impiedosa. Têm
o mundo debaixo de si.
O seu tronco grosso, suporte de ramos e folhas, abrigo
noturno dos seres alados, tem, em si, gravados por namorados apaixonados, o nome dele e dela, metidos em corações atravessados
pelas setas de Cupido.
Lembranças efémeras de amores que não chegam a adultos, que
nasceram para durar pouco.
Mas as raízes continuarão pegadas à terra
alimentando aquele corpo já velho e indiferente aos amores e desamores de quem
goza da sua sombra e corta sem dó a sua pele rugosa.
foto e texto de Benó
segunda-feira, 7 de janeiro de 2013
Perdida
Deixa que me perca no labirinto das tuas palavras, nos murmúrios suaves que a tua boca deixa na concha do meu ouvido.
Nessa música encantada do som da tua voz.
Depois, irás encontrar-me na tempestade que os teus olhos provocam quando se cruzam com os meus.
As minhas mãos irrequietas como velas agitadas pelo vento, prende-as depois, entre as tuas.
Acalma o meu coração tornado barco à deriva sem leme nem âncora.
Juntos, venceremos a tempestade cavalgando no arco íris.
quinta-feira, 3 de janeiro de 2013
Segredos
Por detrás das gelosias, vive-se dias negros de solidão.
Guarda-se segredos não contados porque se se contassem
deixariam de ser aquilo que são.
Chora-se e ri-se. Canta-se e grita-se as dores das saudades.
Conta-se os dias por detrás das gelosias
Amargos, tristes, sós.
Entre os livros, os gatos e as recordações decorrem vidas
sem vida
Compridas, imensuráveis.
Dias longos, horas intermináveis
Num sonho sem fim. Numa realidade sem voz.
Por detrás das gelosias vive-se segredos inconfessáveis.
foto e texto de Benó
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