quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Brincadeiras ao luar

                                                                                                   foto e texto de Benó

A noite tinha acabado de chegar e não viera só, tinha-se feito acompanhar da lua enorme, redonda, brilhante que lançava sombras esguias na rua pouco movimentada.

No adro da igreja brincava-se à vontade, sem receio de raptos ou desaparecimentos e a criançada olhava para aquele grande circulo prateado ainda virgem de pegadas humanas e com as mãozinhas abertas de palmas viradas para cima, dizia:
- Madrinha lua, madrinha lua dá-me um bocadinho de pão com uma sardinha crua!

Inconscientes do significado do pedido mas cientes de que da lua não vinha nada a não ser a linda luz prateada que lhes permitia as especiais brincadeiras noturnas, repetiam a frase rimada e iniciavam as brincadeiras bem distintas entre rapazes e raparigas. Elas faziam rodas e cantavam. Eles corriam e escondiam-se enquanto um outro ficava de olhos fechados a contar – um, dois, três, por aí fora, até 20.
Havia uma verdadeira movimentação atrás das árvores do adro e nas esquinas da igreja.

Não sentiam sono nem cansaço. Só a voz das mães cujas conversas tinham chegado ao fim punha termo em tanta correria. Era a hora de recolher e dormir até que o galo cantasse com o nascer do sol e lembrasse que a escola estava à espera.
O adro ficava vazio e a velha lua retirava-se por detrás de alguma nuvem passageira.

 


sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Marioneta









Nos calmos silêncios em que me mexo, persigo a tua sombra, abraço-a.
Volátil como um fumo opiáceo, pairo suspensa entre o sonho e a realidade. Igual a uma marioneta comandada por cordéis, ergo os braços, tombo a cabeça vencida por recordações, escuto os risos e as fanfarras dos palhaços .

À noite, o vento, meu companheiro nos passeios ao luar, acompanha-me, envolve-me, traz-me o marulhar das ondas incertas e o odor perfumado da maresia.
Tento escrever mas as letras que imprimo são como areia nas dunas da praia, inconstantes, sombras fugidias entre os dedos.

É urgente parar o vento.
Soltar os cordéis.
Viver.

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Nuvens

 
 


 

As nuvens são farripas, farrapos de fios duma qualquer tecedeira, flocos de algodão doce duma qualquer doceira, pastas de lã cardada por uma qualquer cardadeira, elas são imagens criadas por uma qualquer fantasia a habitar no olhar dum qualquer sonhador.

São diáfanas, leves, transparentes ou grossas, prenhas de água na sua cor branca, cinzenta ou azul à espera do momento oportuno para se abrirem e despejarem toda a carga que transportam num refrescar de terras e transbordar de rios e mares.

As nuvens têm os seus momentos mágicos para brincar quando o dia se prepara para partir e a noite ainda não se vestiu com os seus véus noturnos.  Então, elas tomam o pincel do pintor carregam-no de tintas nos mais diversos tons do vermelho ao laranja e em pinceladas largas criam monstros cor de fogo que pairam por algum tempo sobre o grande espelho líquido que as reflete.
 
fotos e texto de Benó

sábado, 7 de fevereiro de 2015

Chorões-maritimos








                             

 

Na árida arriba os invasores chorões-das-praias crescem livremente e cobrem as areias douradas com os pequenos braços no tom verde escuro.
Aqui e ali, florescem as suas flores suaves e efémeras em tom rosa de pétalas leves.
 Mais acima, um pintor incógnito, imortaliza na tela a paisagem impar duma praia aqui perto do jardim. 
 
                                                                                fotos e texto de Benó

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Flores silvestres




 

 
Para se defenderem não precisam de canhões ou de outro qualquer tipo de arma de fogo das que outrora equiparam a fortificação militar, agora em ruínas, onde nasceram e cresceram.

Amparadas pelas pedras seculares daquele forte, enfrentam e defendem-se dos ventos que por ali cirandam em rodopios ou batidas agrestes. Resistem aos sóis escaldantes vindos da África, tão perto e os ares salitrosos que sobem morro acima em dias de tempestade não lhe causam qualquer dano.

Sentem-se privilegiadas por ali terem nascido, alimentam-se do sol e refrescam-se com os poucos pingos de água que as nuvens nos instantes que por ali passam nas suas viagens de destino incerto lhes oferecem entre sorrisos. Sobrevivem ao isolamento, são eremitas em terra de ninguém, outrora dedicada a S.Luis.
São as flores silvestres de nascimento espontâneo nas ruínas do Forte de S.Luis de Almádena com vista para o mar