texto e foto de Benó
Navegou por mares longínquos, ora
mansos como lagos, ora relevados como cordilheiras de altas serras, num sobe e
desce de vagas profundas. As baleias e os golfinhos foram a sua companhia na
descoberta dos cardumes da prata que encheria o seu ventre para se converter no
alimento das famílias e dos homens que o governavam e dele dependiam com
confiança.
Muitas campanhas de gente forte e
corajosa viveram dele e para ele.
Em terra, ficavam os corações femininos
ansiando pelo seu regresso, numa espera longa e, em que, durante esse tempo, saudosas
pelo amor dos homens ausentes, profundos sulcos, sinónimo de cuidados e
canseiras, instalavam-se nos seus rostos jovens.
Envelheciam sozinhas.
Muitas luas se passaram, muitos ventos
zuniram nos seus mastros, muitas vagas
varreram o seu convés. Quantas vezes mergulhou na escuridão dos nevoeiros com o
sol embrulhado em densas teias de humidade. Mas, os seus comandantes, mestres
na arte de navegar, sempre o souberam dirigir com rumos certos para bons
portos.
Agora, tal como eles, a sua vida chegou ao limite.
As tábuas do seu convés esburacaram
carcomidas pelo bicho, pela idade que não perdoa e tudo consome, o seu
cavername, - a sua coluna dorsal -, a sua estabilidade que lhe proporcionava a
forte resistência para vencer a adversidade dos mares, está diminuída; os
motores –o seu coração- pararam para
sempre, já não necessitam de óleo; os porões deixaram de ter condições para
guardar qualquer espécie piscatória, cheiram a mofo, criaram limo, são urnas
vazias.
Hoje só lhe resta o esqueleto
velho, enferrujado, apodrecendo a cada dia que passa, ali, no estaleiro onde permanece
encalhado, a servir de albergue a ratos e baratas, pouso de aves marinhas,
abandonado às intempéries, açoitado por ventos e areias, incapaz de navegar.
Dentro do que resta de si guarda
recordações que não partilhará; vagueiam fantasmas de sonhos e fantasias.
4 comentários:
~
Excelente a sua poesia e o seu texto, Benó.
~ ~ Grata pelos bons momentos de leitura.
~ ~ ~ ~ Dias aprazíveis e amenos. ~ ~ ~ ~
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Um texto excelente. Quantas histórias poderia contar esse barco?
Um beijo, amiga Benó.
Texto muito sentido e muito belo, Benó!
Olá,
Neste tempo de convite: à reflexão, vim te desejar uma Feliz Páscoa.
Que o Criador, esteja sempre de plantão, a perdoar-nos. Porque, somos aqueles, que cometemos falhas, por mais vigilantes, que estejamos.
Um abraço fraterno.
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